"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


domingo, 28 de outubro de 2012

Que não se repita a história de negociação seguida de repressão contra o povo colombiano’



Sergio Ferrari
Colaborador de Adital na Suiça. Colaboração E-CHANGER


Tradução: ADITAL

- "O movimento social não pode ficar de fora do processo de paz”
- "É imprescindível que cessem as hostilidades imediatamente”
- "Confiamos na Rota Social Comum para a Paz”


O movimento social colombiano "vem dando passos importantes para uma
maior unidade”, o que lhe permite perceber o processo de paz com
relativa segurança. No entanto, é fundamental continuar limando as
diferenças e começar a esclarecer "quem assumirá como porta voz de
dito movimento na hora da negociação”. Diagnóstico e perspectivas
colocados durante uma visita recente a Europa por Marylén Serna
Salinas, dirigente camponesa de Cajibío (Cauca, sudoeste colombiano),
uma das responsáveis em âmbito nacional pelo Congresso dos Povos,
espaço que reúne a inúmeras iniciativas, organizações e plataformas
sociais e que aposta, juntamente com outros atores sociais, em
participar ativamente na construção "de uma paz com justiça na
Colômbia”.

Entrevista.

P: Como você percebe o movimento social na atual cojuntura de diálogo
para a paz?

R: No princípio, com surpresa; agora, com uma grande expectativa.
Estamos gerando as condições para uma participação efetiva no processo
de paz. Queremos afiançar um movimento real pela paz que seja
inclusivo, no qual participem todos aqueles que vieram contribuindo
desde anos e desde distintos cenários e regiões a esse objetivo.
Propomos também chegar a um consenso e construir entre todos o que
denominamos "agenda social”, ou seja, as propostas e temáticas
concretas que expressam as reivindicações dos diferentes setores
sociais. Somos conscientes que é essencial definir a forma
organizativa da participação do movimento social no processo de
negociação. Porque milhares não poderão sentar-se a negociar. Nosso
dilema é como ser participativos, diversos, inclusivos e, ao mesmo
tempo, garantir contribuições reais, concretas, sistematizadas,
consensuais, ao processo em marcha.

P: Quem e como pode convocar ao conjunto para que, desde a sociedade
civil, desde a base se participe no processo de paz, dada a
multiplicidades de atores sociais na Colômbia atual?

R: É uma pergunta chave. É inimaginável que somente o Congresso dos
Povos consiga isso. Nem tampouco somente o movimento social articulado
pode chamar para si a representação da sociedade colombiana em seu
conjunto. Há que ir além. Conscientes dessa realidade, há seis meses,
convocamos a promoção da Rota Social Comum para a Paz, onde têm
influído diferentes setores e plataformas que coincidem na necessidade
de uma saída política ao conflito armado. A Rota foi lançada
publicamente no dia 8 de outubro de 2012, no marco de uma mobilização
nacional convocada na semana da indignação. Sou otimista quando vejo
que nos últimos dois anos ampliou-se o espaço de unidade popular, que,
agora, reconhece a essa Rota Social Comum para a Paz como uma proposta
importante. Participam ou a apoiam, dentre outros, movimentos de
vítimas, as organizações estudantis, alguns setores dos trabalhadores,
Colombianos e Colombianas pela Paz, a Marcha Patriótica, a Rede de
Iniciativas de Paz desde a Base, o Congresso dos Povos, a Coalizão de
Movimentos Sociais da Colômbia, e inúmeras outras iniciativas...

A representação do movimento social

P: Qual é o debate mais complicado no interior de um grupo tão diverso?

R: Penso que será aquele em torno ao conceito da paz e da
participação. Em relação à agenda, todas as nossas organizações e
cenários estão trabalhando os conteúdos. E, hoje, já temos uma série
de insumos. Não queremos inventar nada novo; mas, sistematizar melhor
o consensual. Me parece que a maior dificuldade no interno do
movimento social será sobre a questão de sua representatividade no
diálogo e na negociação, porque somos muitos: há organizações locais,
plataformas, regiões inteiras, povos indígenas, os afrodescendentes...
E, da mesma maneira que não queremos entregar nossa voz de movimentos
sociais às insurgências e nem ao Estado, será denso definir a quem
entregaremos nossa representação no processo de negociação da paz... E
aí, colocaremos à prova os avanços reais que fizemos até agora quanto
à unidade.

P: Trata-se de um movimento social amplo. Porém, no momento, os que
estão montados no trem da negociação são um setor da insurgência e o
Governo. Qual será a reação de um e de outro quando o movimento social
unificado exigir participar também nesse processo?

R: Penso que haverá mais dificuldade com o Estado. De fato, o Governo
já propôs que o método de participação da sociedade civil será através
do Conselho Nacional de Paz, que é uma figura institucional, não
autônoma e subordinada ao poder. Nesse Conselho, o movimento social
teria uma participação reduzida, já que há outros setores, como os
empresários, que também estarão presentes. Essa proposta oficial não é
suficiente. Inclusive, na Rota Social Comum para a Paz, está em
discussão se participaríamos ou não nesse espaço. Portanto, já vemos
que essa será uma disputa que, com certeza, vamos poder dirimir
somente com a mobilização, tal como fizemos na primeira quinzena de
outubro. Para exigir a ampla participação, para ambientar a paz, para
posicionar a necessidade de uma agenda social. Com respeito à posição
da insurgência: o Exército de Libertação Nacional (ELN) sempre foi
explícito quanto à necessidade de que a sociedade civil participe no
processo de paz. As Farc, especialmente em suas últimas intervenções,
também falaram sobre essa necessidade.

O trem da paz

P: O processo de diálogo Farc-Gobierno já está lançado. Há riscos de
que os tempos políticos dessa negociação não coincidam com os do
movimento social que, todavia, não participa em dito processo?
Podendo, portanto, ficar fora desse trem em marcha…

R: Pensamos que a agenda definida para esta fase de negociação entre a
insurgência e o Estado não pode ser muito carregada porque seria
arrebentá-la. Para o atual momento de negociação, é suficiente; apesar
de que é insuficiente para um processo de paz mais estratégico.
Estamos acompanhando esta fase com alegria e sem movimentações; em
todo caso, pelo menos como Congresso dos Povos gostaríamos de garantir
a nossa participação. Queremos acelerar nossa preparação enquanto
movimento social para subirmos no trem em uma próxima fase, na qual se
debata uma agenda social que integre temas estruturais, como
terra-território, as políticas econômicas, a presença das
multinacionais no país, os direitos do povo (educação, saúde), a
justiça e a reparação ligadas ao debate sobre a impunidade...

P: Algumas organizações na Colômbia insistem em que é necessário que
se iniciem, em curto prazo, os diálogos humanitários regionais entre
os atores armados, o Estado e as organizações sociais, para discutir
temas muito concretos, como a não incorporação de crianças e jovens à
guerra, o direito humanitário etc. Ditos diálogos são todavia
penalizados pelas leis. Qual é sua visão?

R: Seria importante garantir um cessar fogo enquanto a negociação
avança. É essencial que o conjunto do povo entenda a dinâmica e a
necessidade da paz, o que não se conseguirá caso continue o conflito
nas comunidades, no território.

P: Como sintetizaria sua mensagem à comunidade civil internacional?

R: Que há um ressurgimento do movimento social e do desejo da unidade.
Hoje, esse movimento aposta a um processo de paz com justiça social. E
que é imperativo o acompanhamento, a solidariedade e o apoio da
comunidade internacional.

P: E o cessar imediato de hostilidades nos territórios?

R. Sim, também. Ressalto três conceitos importantes: que as duas
insurgências participem da negociação para evitar que o processo atual
fique coxo; que haja um cessar de hostilidades nos territórios; e que
nos deem garantias para a inclusão efetiva do movimento social, porque
não podemos imaginar que nós participemos; mas, ao mesmo tempo,
sejamos ameaçados e perseguidos. E esse é um chamado bem concreto ao
Governo. Que não se repitam outras experiências que vivemos, onde a
sociedade civil lutou para participar na negociação e foi ameaçada,
estigmatizada, perseguida e assassinada.

P: O que, atualmente, é diferente e confere ao movimento social
confiança em que essa construção atual da paz possa prosperar?

R: Que o movimento social está, realmente, se apropriando da
construção da paz e a exige. Ganhamos em unidade apesar de que ainda
temos que avançar muito. E isso sem esquecer que, na Colômbia, as
pessoas estão muito cansadas da guerra. Por isso, impera um marco
favorável para construir a paz com justiça social.

[Sergio Ferrari, em colaboração com E-CHANGER, ONG de cooperação
solidária presente na Colômbia].