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Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Os tentáculos da espionagem dos EUA no Chile



Por: HUGO GUZMAN R.
(Publicado em “Punto Final”, edição Nº 726, 7 de janeiro de 2011)
www.puntofinal.cl

Na moderna e protegida estrutura de aço e cimento que serve de sede à embaixada dos EUA no Chile, na Avenida Andrés Bello, com o rio Mapocho nas costas e a torre Titanium e o luxuoso Intercontinental Hotel pela frente, funcionam vários escritórios que servem à espionagem norteamericana. Possuem infraestrutura de informática e telecomunicações bem como tecnologia para trabalhos de inteligência. Possui um grupo de funcionários especializados em compilar informação sensível sobre o Chile e planificar e coordenar operações.

Nesse edifício opera o DEA (Agência Antidrogas dos EUA), o FBI/Legal Attaché
(Bureau Federal de Investigação, Adido legal), o Grupo Militar, um escritório de segurança, o ONR (de Investigação Naval), o Instituto de Segurança Regional e, camuflada, a “estação CIA” em Santiago. Todas são entidades da “comunidade de inteligência” dos EUA, estabelecidas em território chileno. Formalmente, a Constituição chilena e as leis chilenas não limitam o seu âmbito de operações no país.

Dessas dependências, textos criptografados ou protegidos como Secret, Top Secret ou Confidencial, saem relatórios e analises sobre questões e episódios da realidade chilena que, a julgar por investigações do Senado estadunidense e revelações da mídia (como o caso recente do WikiLeaks) incluem avaliações sobre pessoas e organizações locais.

A atividade de espionagem norteamericana no Chile é protegida pelo manto do combate ao terrorismo, combate ao narcotráfico e proteger a segurança dos EUA. É assim que o Ministério do Interior, o Ministério da Defesa, as Forças Armadas, a Policia de Investigações (PDI, que copiou a imagem corporativa do FBI adotando siglas, tipografia e cores análogas para sua imagem) e Carabineiros, mantêm laços com os escritórios do DEA, FBI, o Grupo Militar e a CIA no Chile.

O encarregado do escritório do DEA é o agente Sean Waite e pelo FBI, o agente Todd Porter. Liseli Pennings é a adida de Segurança e o adido de Defesa é o capitão de navio Ronald Townsend. À frente da pasta de aeronáutica está o coronel Nelson Johnson e da pasta militar, o coronel Frank Wagdalt. O comandante do Grupo Militar é o coronel Marc Stratton.

Em um texto da embaixada, intitulado Nosso propósito, afirma que “a cooperação bilateral na fiscalização e no cumprimento da lei ajuda-nos a combater o terrorismo, o narcotráfico e as atividades criminosas. Os sólidos laços militares existentes contribuem para a estabilidade regional, melhoram a interoperabilidade com as forças armadas dos EUA e reforçam a capacidade do Chile para participar em missões de manutenção da paz e outras operações de segurança”.


Escritórios que espionam

De acordo com a legislação norteamericana, o FBI encarrega-se da segurança nos EUA. Portanto, presume-se que os agentes dessa agência que trabalham no Chile deveriam limitar o seu trabalho àquilo que tenha a ver com “ameaças” contra a segurança de cidadãos ou bens norteamericanos. Mas isso está longe de se cumprir, pois por sua parte a CIA realiza trabalhos de inteligência em outros paises e não só defende e protege os interesses dos EUA (dos governos da vez e das grandes corporações), mas se materializa através de operações contra presidentes, governos, empresas, organizações políticas e sociais e contra grupos terroristas. São bem conhecidas suas operações no Chile, Guatemala, Nicarágua, México, Venezuela, Bolívia assim como na Ásia, África e Europa, que tem motivado investigações do Senado norteamericano. É ampla a documentação sobre a ação da CIA no golpe de Estado de 1973 no Chile.

O chamado Grupo Militar é a representação do Comando Sul, entidade das forças armadas norteamericanas que desenvolve os planos doutrinários e operacionais para a América Latina e Caribe. Este escritório organizou a ida de mais de cem militares chilenos para a Escola das Américas, na Geórgia, para um treinamento que o ministro da Defesa do Chile, Jaime Ravinet, disse ser “muito importante”. Nessa escola também foram preparados em contrainsurgência milhares de militares da região.

O Gabinete de Segurança Regional (RSO), segundo documentos dos EUA “é responsável pela segurança do pessoal norteamericano que trabalha nas embaixadas e consulados dos EUA ao redor do mundo”. É “o braço encarregado da segurança e cumprimento da lei do Departamento de Estado. Cada escritório é administrado por um agente especial de segurança diplomática, que serve como consultor especialista em assuntos de aplicação da lei e de segurança para o embaixador dos EUA”.

O RSO no Chile analisa material de inteligência e informação para estabelecer ações de espionagem com a finalidade de proteger a embaixada e o consulado, “organiza e treina a polícia estrangeira e oficiais de segurança para combater o terrorismo, assessora os norteamericanos sobre segurança no exterior, compartilha informação de segurança com o setor privado norteamericano”. Uma atividade pouco conhecida no Chile.

O ONR, ou Escritório de Investigação Naval tem a função de promover programas de investigação, ciência e tecnologia entre as Marinhas. Chama a atenção o “privilégio” que o Chile goza com essa agência, já que esta tem representações somente em Londres, Tókio, Austrália, Cingapura e...Santiago!

As mensagens que essas agências de inteligência, policiais e militares, elaboram, assim como documentos e analises, tem como prioridade alimentar os computadores do Departamento de Estado, do Pentágono, do Departamento de Justiça, do Comando Sul, do Centro Nacional de Luta Antiterrorista, da Agência Nacional de Segurança e, eventualmente, do Departamento do Tesouro.

Em um relatório sobre terrorismo divulgado pelo governo dos EUA, assinalava que “os EUA estão fortalecendo as alianças regionais e transnacionais, a fim de combater efetivamente as atividades terroristas”. Nisso inclui-se o Chile, onde há sinais de que as agências de espionagem dos EUA não botaram somente as mãos.


Operações encobertas no Chile

Há casos recentes que revelam – não em todo seu alcance – as operações da inteligência norteamericana no Chile.

De acordo com o revelado pelo WikiLeaks, o ex-ministro do Interior, Edmundo Pérez Yoma, pediu ao então embaixador norteamericano ajuda em inteligência sobre grupos mapuches. O funcionário respondeu que “o FBI já está coordenando com os Carabineiros” para detectar movimentos dos indígenas (ver PF Nº 725). A informação serviu para que organizações e meios de comunicação de organizações mapuches para lembrar que faziam denuncias desde 2008 e que agentes estavam percorrendo a cidade de Temuco e as comunidades indígenas, assessorando os Carabineiros e a PDI.

No caso do paquistanês Saif Khan, que foi inocentado das acusações, houve uma coordenação irregular (segundo denuncia de seus advogados) entre o FBI e a PDI para acusá-lo e criar uma atmosfera de “atividade terrorista”, envolvendo na trama até a Al Qaeda. O ex-chefe do FBI no Chile, Stanley Stoy, teve que renunciar a sua imunidade diplomática, testemunhar no caso e deixar o país. Um episódio de clara subordinação da PDI ao FBI se produziu quando, estando o cidadão paquistanês detido na embaixada sem que, formalmente, o acusassem de algo, a equipe de investigação, formada pelo chefe do FBI, invadiu o domicilio de Saif Khan.

Sabe-se que no Chile opera uma “estação da CIA”. O jornal El Mercúrio reconheceu, em 19 de dezembro passado, os “históricos laços do Chile com o FBI e a CIA” e que existe um “representante” da CIA no país, “ainda que seu cargo na embaixada não está oficialmente explicitado dessa forma”. Os agentes da CIA costumam trabalhar na Assessoria Política da embaixada ou na USAID (Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional).

A CIA esteve por trás das investigações sobre cidadãos estrangeiros no Chile, suspeitos de terrorismo. Seus agentes também costumam compilar, direta ou indiretamente, informação política e sensível em conversas com políticos, militares e empresários chilenos.

Das atividades dos EUA com órgãos policias chilenos, refletem uma série de episódios recentes. Funcionários de Carabineiros e da PDI participaram de uma conferência sobre o controle de drogas no Brasil, organizada e patrocinada pelo DEA. A isto se acrescenta a participação de promotores de justiça e policiais em um curso de treinamento em técnicas antiterroristas realizado pelo FBI na Virgínia, no contexto do Programa de Assistência Antiterrorista que o governo dos EUA promove. Na mesma linha, o Ministério Público chileno pediu apoio ao FBI no “caso bombas”.

Vários órgãos de imprensa divulgaram que a Equipe de Reação Tática Antidrogas (ERTA), da PDI, teve influência direta e conexão com a formação e experiência do DEA e FBI. Também se soube da participação de membros do Grupo de Operações Especiais (GOPE), dos Carabineiros, em atividades rotuladas de “exercícios de comando”, realizados pelos norteamericanos.

Em meados de 2010, o Ministério do Interior aderiu à Rede de Intercâmbio de Informações em Linha (LEO), do FBI. Assinaram o acordo o então chefe do Bureau em Santiago, Stanley Stoy (ligado ao caso do paquistanês) e a Subdiretora da Divisão de Segurança Pública, Constanza Daniels. O nível de colaboração das autoridades chilenas com os órgãos dos EUA é tal, que os norteamericanos disseram que o Ministério do Interior “é a primeira e única agência governamental não policial no mundo que foi convidada pelo gabinete de ligação do FBI” para fazer parte da LEO, à qual tem acesso os Carabineiros e a Promotoria Nacional.