"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


terça-feira, 17 de novembro de 2009

Honduras: o império contra-ataca

A crise hondurenha finalmente se resolveu “pelo lado mau”: a consolidação do regime golpista e a institucionalização das eleições ilegítimas marcadas para o próximo dia 29 de novembro. Já a Casa Branca declarou que seus resultados serão admitidos como válidos, comemorando-se assim a normalização da vida democrática e pondo um fim ao “interinato” de Micheletti, eufemismo com o qual desde o início Washington caracterizou o golpe de Estado. Este desenlace tem um significado
que ultrapassa em muito a política hondurenha: marca a volta dos Estados Unidos à sua tradicional política de apoio aos golpes militares e aos regimes autoritários afins com os interesses imperiais.

Diante desta lamentável involução da política exterior norte-americana, muitos observadores defendem que a vitória dos golpistas põe em relevo o declínio da hegemonia norte-americana. Corolário desta constatação é a inocentização de Obama porque, supostamente, apesar de seus esforços não teve como resolver a crise de modo compatível com a institucionalidade democrática.

Até que ponto esta interpretação é correta?

Há duas questões que devem ser examinadas: por um lado, a progressiva perda de capacidade hegemônica dos Estados Unidos na região. Por outro, as iniciativas concretas tomadas pela Casa Branca no marco da crise hondurenha. Em relação à primeira questão, é preciso reconhecer que a superpotência enfrenta uma diminuição de sua capacidade de dominação e controle sobre o sistema internacional, assim como sua gravitação econômica global, o que não significa que esta tendência foi transportada mecanicamente para a América Latina e o Caribe. Não seria temerária, mas muito mais próxima da verdade, a hipótese que havia dito de que, diante do enfraquecimento relativo do império na arena mundial, aquele se aferra com mais força ao “seu quintal” e seu estratégico entorno de segurança territorial. Daí que seu declínio global não necessariamente signifique uma deterioração equivalente de sua capacidade para controlar sua tradicional “zona de influência”. Não há dúvidas que o predomínio que os Estados Unidos tinham antes na região se debilitou; mas, seria um erro gravíssimo crer que desapareceu.

Esclarecido este primeiro ponto, pode-se dizer que Obama agiu com todas as suas forças para resolver num sentido democrático a crise hondurenha? Definitivamente, não. Suas iniciativas foram vacilantes e com o correr do tempo os falcões que ainda formulam as políticas fundamentais do estado norte-americano impuseram sua linha. É certo: a Casa Branca não foi capaz de impor outra política em Honduras, mas quem o fez foram os Estados Unidos como potência imperial, como expressão de um sistema de dominação interno e internacional. Para compreender isto é preciso distinguir entre o “governo permanente” desse país, essa nefasta rede de grandes oligopólios, lobbies, Forças Armadas, políticos profissionais e grandes meios de comunicação que, como dissera Gore Vidal, mantém sequestrada a sociedade norte-americana e, por outro lado, o “governo aparente”, simbolizado na figura do presidente. Mas o progressivo esvaziamento da democracia norte-americana ocorrido no último meio século enfraqueceu as margens de autonomia da presidência para promover (no hipotético caso de que quisesse) uma política contrária aos interesses da classe dominante.

A hipótese do declínio hegemônico fica desmentida pela recente assinatura do tratado de cooperação militar entre Estados Unidos e Colômbia que, como recordara o Comandante Fidel Castro, equivale praticamente a uma anexação desse país sul-americano aos Estados Unidos. Esta iniciativa demonstra a formidável capacidade de pressão, dominação e controle que o império ainda conserva, apesar do seu suposto enfraquecimento. É essa mesma capacidade que o levou a tirar rapidamente da cena negociadora em Tegucigalpa o secretário-geral da OEA para substituí-lo por um velho peão da política norte-americana, Oscar Arias. É essa mesma capacidade a que o leva a sustentar contra vento e maré o criminoso bloqueio a Cuba, mesmo tendo a Assembleia-Geral da ONU condenado essa política por 187 dos 192 países que a integram. Ou a que lhe permite não dar ouvidos ao clamor universal de indultar os cinco lutadores antiterroristas cubanos submetidos a condições desumanas de prisão nos Estados Unidos graças a uma escandalosa subversão do devido processo legal. Ou manter uma infame prisão, violadora de todos os direitos humanos, na Base Naval de Guantánamo.

Se Obama tivesse demonstrado esta mesma determinação para exigir a imediata restituição de Zelaya à presidência, a história teria sido outra. E tinha instrumentos à mão para fazê-lo: poderia ter decretado o transitório bloqueio das remessas dos imigrantes hondurenhos residentes nos Estados Unidos; ou instruído as empresas norte-americanas radicadas em Honduras que preparassem planos para sua eventual retirada do país; ou congelado os fundos dos políticos do regime e da oligarquia depositados em bancos norte-americanos; ou embargar suas faustosas propriedades na Flórida. São gestos nada inéditos; quase todos eles foram utilizados por George W. Bush para frustrar a vitória tida como certa de Schafik Handal, candidato da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional, nas eleições de 2004 em El Salvador. Por que não se tentou algo similar nesta ocasião? Resposta: porque a política do “governo permanente” dos Estados Unidos, de seu establishment, dispôs outra coisa e o inquilino da Casa Branca se inclinou para essa decisão.

Conclusão: não é que os Estados Unidos não puderam modificar o resultado da crise hondurenha mas que, para além das opiniões de Obama, a classe dominante norte-americana – ou seja, o famoso complexo militar-industrial – convalidou sem reservas o golpismo mesmo sabendo das funestas implicações que esta decisão teria para a paz e a estabilidade política desse país centro-americano e para o futuro da região. Não se tratou de uma questão de incapacidade, mas de uma escolha estratégica concebida para reordenar manu militari o tumultuoso quintal do império na América Central e, também, para lançar um sinal de advertência aos governos de esquerda e progressistas da região.