"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


quinta-feira, 12 de junho de 2008

As guerrilhas não são uma moda, são uma resposta à repressão e ao fechamento político

por Pedro Echeverría V. [*]

1. Incrível! Será que Hugo Chávez entrou num estado de desespero ou alguém imitou a sua voz para que os meios de informação do mundo, ao serviço do império ianque, divulgassem jubilosamente as suas declarações ? Obviamente, as FARC e as demais guerrilhas do mundo não vão fazer caso desse apelo formulado, aparentemente, domingo passado às guerrilhas colombianas para que libertem, "em troca de nada", reféns em poder dos rebeldes. Além disso, disse que "a guerra de guerrilhas passou à história... e vocês nas FARC devem saber uma coisa: que se converteram numa desculpa do império (o governo dos Estados Unidos), para ameaçar-nos a todos nós". Chávez recebeu o aplauso dos governos que estão ao serviço os EUA e, mais ainda, agora exigem que cumpra sua palavra. O passo seguinte dos cães do império será agora exigir-lhe que extermine os terroristas, os lutadores radicais e os rebeldes.

2. Hugo Chávez sabe perfeitamente que os ianques não necessitam de desculpa alguma para ameaçar. O governo dos EUA ameaça e submete a quem lhe dê na gana. Bush dividiu o mundo em aliados e terroristas. Invadiu o Afeganistão porque, segundo disse, ali se ocultava Bin Laden. Depois invadiu o Iraque com o argumento de que escondia um grande armamento, mas os enviados da ONU informaram que este nunca existiu. Chávez sabe que os EUA não precisam qualquer pretexto porque há vários anos seleccionaram os países que fazem parte, segundo seus critérios, do "Eixo do mal" e iniciaram uma série de agressões contra eles e seus vizinhos. Quando os EUA decidem dar um passo, pretextos não lhe faltam. Durante décadas, de modo permanente, disse que suas repetidas intervenções armadas eram para apoiar os interesses dos seus cidadãos e salvar seus investimentos. Chávez sabe-o melhor do que ninguém, por isso parece-me estranha a sua posição e até tive dúvidas que fosse dele.

3. Que corrente de esquerda pode negar ou regatear o enorme papel que Chávez desempenhou nos últimos oito anos na Venezuela e na América Latina frente ao saqueador e assassino governo Bush? Mais ainda, foi considerado o aluno com mais peso e, ao mesmo tempo, o herdeiro das lutas anti-imperialistas de Fidel Castro no continente. O que se passou então na cabeça de Chávez ou na dos seus conselheiros ao pensar que as condições políticas venezuelanas são idênticas às do México, Haiti, Guatemala, El Salvador ou Colômbia? No México, quando se dá esse tipo de mudanças intempestivas ou que não nos damos conta, perguntamos: O que fumaste? Ou advertimos: "estás a urinar fora do bacio". Chávez sabe muito bem que as guerrilhas e outras formas de luta como os movimentos de massas, as greves gerais, os piquetes bloqueando avenidas e praças, bem como outras mais batalhas dos explorados, não podem estar fora de tempo.

4. Os empresários e governos, em todo o mundo, desejariam controlar absolutamente tudo: monopolizar a economia, a política, a propriedade, a cultura. Assim o fizeram durante séculos apesar das débeis oposições e protestos. Contudo, essa classe social dominante teve de dar passos atrás, fazer concessões e por em prática reformas agrárias, laborais, eleitorais, só devido à pressão das lutas dos trabalhadores. Hoje talvez nuns 20 por cento dos países, sobretudo na Europa, por lutas que duraram séculos, a burguesia teve que ser "inteligente" para respeitar as lutas legais da oposição. Mas nos outros 80 por cento dos países a repressão contra os trabalhadores foi aberta e brutal. Inclusive em países como o México, onde os processos eleitorais foram implantados em 1824, 70 por cento da população continua a viver na pobreza e na miséria. Basta apenas esse dado para demonstrar até que grau a população é exploradas e oprimida.

5. A guerrilha na América Latina não pode sair de moda porque as condições económicas e políticas do continente, prejudiciais à maioria da população, continuam em vigor. Registaram-se enormes mudanças nas cidades, a tecnologia cresceu sem paralelo, os automóveis multiplicaram-se nas cidades e 80 por cento da população tem pelo menos uma televisão, mas para os explorados e oprimidos, para os milhões de desempregados e marginalizados de sempre, parece que não passaram os séculos. Para aproveitar e dar continuidade a este estado de coisas a burguesia submeteu com grande sanha o mais mínimo protesto ou oposição. Se Chávez não houvesse utilizado a força, ou certo grau de força, na Venezuela estariam a governar os partidos burgueses tradicionais, os meios de informação continuariam a idiotizar a população e os ianques continuariam a saquear os recursos naturais. Talvez o próprio Chávez estaria a ser defraudado no aspecto eleitoral.

6. O que fariam as FARC frente a um governo abertamente assassino, como o de Álvaro Uribe (apoiado pelo governo Bush) que se refreia um pouco em bombardear acampamentos pela existência de presos trocáveis? Esquece-se por acaso que muitos desses presos actuaram contra o povo e foram uma moeda necessária de troca com os heróicos presos guerrilheiros detidos pelo governo? É compreensível o desespero de Chávez e a pressão que sofre da parte dos familiares desses presos, mas a guerrilha surgiu há 44 anos para lutar pelos interesses dos explorados e dos mais pobres e é ela que tem de decidir o que fazer. Chávez não pode usar o seu prestígio, a sua grande autoridade, para pedir o desaparecimento da guerrilha. Certamente na Venezuela, na Bolívia e no Equador não é necessária a guerrilha porque os pobres, os explorados, agora estão a experimentar um novo governo que lhes deu espaços para encaminhar as suas petições e as suas lutas, mas não no México, na Guatemala e demais.

7. Fidel Castro assumiu o poder em Cuba em Janeiro de 1959 depois de encabeçar uma guerrilha e com ela tornar possível o triunfo da Revolução contra o ditador Batista. Depois Castro, como presidente, apoiou mais de cinco movimentos guerrilheiros que lutavam contra governos pro-norteamericanos no continente. Não foram apoios materiais porque Cuba carecia de meios para concedê-los, mas Fidel nunca deixou de analisar nos seus longos discursos a pobreza e o desespero dos povos perante um império ianque associados às burguesias nacionais de cada país. Hugo Chávez não assumiu o poder pela via guerrilheira e sim pelo processo eleitoral; mas teve de enfrentar a violência com o apoio do exército quando se rebelou contra o governo Carlos Andrés Pérez e quando, em 2002, foi "derrubado" por 48 horas. Os explorados nunca foram violentos por gosto, utilizaram a violência para defender-se da classe dominante que nunca os deixou viver em paz.

8. No México os movimentos guerrilheiros estiveram presentes em toda a sua história. Durante o colonialismo espanhol a guerrilha indígena foi permanente. A própria luta de Independência iniciou-se como um levantamento que logo se tornou uma resistência guerrilheira. As invasões ianques e europeias do México no século XIX sofreram os permanentes fustigamentos de guerrilheiros heróicos. Durante o Porfiriato e a Revolução os guerrilheiros, talvez mais que os exércitos formais, desempenharam um papel importantíssimo. O que foram as guerrilhas mexicanas de Ciudad Madera (Chihuahua), de Jenaro Vázquez e Lucio Cabañas do estado de Guerrero, as guerrilhas urbanas de princípios dos 70 e por que são actuais as guerrilhas hoje encabeçadas pelo EPR? Cada guerrilha responde a condições concretas: injustiças, miséria, fechamento, repressão, desespero, perseguição, ameaças. Ninguém poderá exterminar as guerrilhas se não se transformam as relações sociais. Chávez sabe-lo, por isso não creio no que ouvi.

[*] Analista mexicano.

O original encontra-se em http://www.resumenlatinoamericano.org/

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